sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Encontro Marcado



O encontro está marcado. Não espero outra coisa senão encontrá-la. O relógio anda. Sob a marquise enlodada e mal pintada sinto o vento da noite passar - e escorado em uma cadeira carcomida a espero – nada mais. No porto apitam os navios que se despedem da terra em um longo e sonoro adeus. Nas calçadas atulham-se prostitutas que vêem no barco que desaparece na escuridão mais um ganha-pão que se distancia – terão fome amanhã?
Perto dos postes, sentados em tamboretes, guardadores de carros distraem-se jogando dominó à dinheiro e fazem vales nos fiteiros próximos, apostando no próximo carro que estacionará na rua, para pagarem suas dívidas. A noite cai mais profundamente - cessam as buzinas, fecham-se as lojas. Ainda a espero, agora sentado em um bar de marinheiros, onde pululam os idiomas e os risos de álcool e sarcasmo. Mulheres garantem o amanhã, vendem suas carnes com cheiro de sal e do homem anterior, a que elas serviram. Observo. Sinto um falso escárnio da vida. Um certo moralismo, um falso gosto amargo na boca, uma vontade de vomitar. Sinto uma mentira.
Observo mais. Sinto um prazer escondido se movendo e um alívio. Percebo também outras coisas, que não tinha visto. Peço uma cerveja. Ao longe duas mulheres me olham com interesse. Eu ainda a espero. A noite me abandona aos poucos e eu não vejo nada além da luz entrecortada de uma lâmpada fluorescente no fundo do bar, que aos poucos se torna baça. Elas ainda me olham. Mexo-me na cadeira e peço outra cerveja. Olhando para a rua vejo um primeiro casal que sai cambaleante - e a mulher, com os braços envoltos no marinheiro, percorre o seu bolso com o carinho peculiar das mulheres quando querem percorrer bolsos sem serem sentidas. Ele está feliz. Ficará feliz por toda a noite.
Eu ainda espero. Elas agora estão em uma mesa mais próxima e me pediram um cigarro, que eu não fumo ou não fumava – não posso precisar. Agora, meio distantes, conversamos sobre coisas sem importância, enquanto uma das mulheres vai ao banheiro vagarosamente. Ao retornar, à guisa do álcool e da embriaguês que ela não tem, senta-se em minha mesa e comenta, com um espanto malicioso, de quem sabe reconhecer um homem que ainda não está bêbado, que havia errado de lugar. Eu as convido para sentarem-se.
Lembro da minha carteira e de quanto poderia ainda ter por lá. Já não a espero.

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