quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Caminhante


Caminho como quem apanhou:
- carcomido, alma sedada, sem sentir.
O que vês agora, aquela que me amou
Consumiu até quase tudo se esvair!

Agora amo apenas com cuidado
Que o que restou me é pouco e caro:
E se num rompante não sou mais levado,
É porque o amor em mim é artigo raro.

E digo baixo: como quem tem medo de ferir,
Porque na dura carne volta agora o sangue a fluir
E sinto dos escombros de tudo que esteve a ruir
Minhas pernas, meus olhos e uma chama surgir.

Desse fogo claro, quente e tremulante
Que atiça o medo e espanta o amante
Vivo olhando as sobras e o levante:
Será fogueira um dia? Quem sabe adiante.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

O rio



Saio sob o sol e descanso sob a sombra das palmeiras, que me entrecortam como entrecortam-me os pensamentos do que já foi. Olho o rio – lanço em suas águas os últimos pedaços de amor que sobraram em mim e acolho o vento que passa, respiro a umidade do rio, admiro o mangue e o lixo que passa. Quantos já não jogaram aqui também os seus pedaços de amor? Não seriam esses escombros que bóiam? Impossível saber - pedaços de amor não são amores...
E saber isso, depois de tragar o último gole de um copo de cerveja já quente – quente por obra do sol incidente, acidentalmente incidente- é salgado como morder a própria língua e ver escorrer – por obra da dor- a última lágrima de crocodilo que poderia nascer de um sentimento assassinado, mas não nasceu.
Sorrio para mim mesmo. Passa pelo rio, flutuando, uma caixa de geladeira.
Os de coração gelado também amam?