sexta-feira, 11 de abril de 2014

Uma Pedra só Coração


Ser coração, como pedra, sólido.
Maciço de rocha no vão construto.
Ou pássaro caído do céu feito bólido
Ou um risco no ar parecendo um fruto.

Uma pedra-coração, oca, púrpura
De ametista, translúcida, pura.
Não mineral, de pouca gramatura
Pedra pequena, feita mais dura.

Pedra ordinária, do chão comum
Onde pisam os pés mais avaros
Pedra no ornado de debrum.
Coração ou pedra ou peça de reparos.

Uma pedra assim tão singular
Que ainda então todos carregam por si.
Não lhes dão, nem lhes podem apartar
Feito prata da mina de Potosi.

Nem de muita valia, nem de pouco ganho
Carregada pendurada em corrente,
Por vezes nem presa, só pendente,
É a pedra que no sangue está em banho.

Clivada, circular, esférica, polida
Com o tempo rola, não é mais partida.
É pedra velha e gasta, pedra falida
Na arte de ser pedra, coração ou vida.

De pó, vermelha, lascada, ruída
Da lasca, o corte, a cor, a ferida
É parte latente da carne rompida
É pedra menor, mas não confundida

Com a outra maior, pedra-ferrugem
Que da água salgada do mar surge
Como as coisas que no mundo nunca urgem
Tal a hora que, sendo marcada, só punge.

É pedra-relógio e também coração.
É coisa lamacenta, úmida, do chão.
É matéria que não se pega com a mão.
É o tempo, a ampulheta e o grão.

Nenhum comentário: